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Saudade das Horidens, né, minha filha?

Eu sei que essas meninas deixaram vocês apegadas e quando eu fico muito tempo sem falar delas, o coração até erra uma batida. Então, que tal uma ceninha extra enquanto vocês esperam o livro da caçula?

 

PS: Se você ainda não leu “Tudo pela Liberdade” eu recomendo fortemente que conclua a leitura antes de prosseguir. A cena a seguir carece da leitura do mesmo para compreensão e contém spoilers.





Rose’s House, Londres, 20 de novembro de 1824.
Lady St. Crowell sacudia o pé por debaixo da saia, inquieta. Mastigando a ponta do lápis e analisando o rascunho na folha do caderno surrado por tanto manuseio. Não era a hora, tampouco o lugar, mas a inspiração se mostrava dessa forma mesmo. Infernal e maravilhosa. Aparecia quando menos se esperava.
Não ficara ruim. Nada mau, porém sempre tinha a sensação que poderia fazer melhor se tentasse. E se havia um momento mais propício para dar o seu melhor, desconhecia. Aquilo precisava ser completamente extraordinário e mais do que isso precisava ser eficiente.
Seu objetivo sempre foi criar roupas com um propósito. Com uma função e ousava dizer que aquele modelo tinha um dos propósitos mais nobres a que suas roupas já foram destinadas.
— Desenhe de novo, Dalila! — Soou uma voz por cima de seu ombro. — Esse rapaz está muito franzino.
Daisy espremeu os lábios um contra o outro tentando não gargalhar diante de Lady Limett. A velha dama de cabelos grisalhos caminhava até sua poltrona com o pequeno Rei George trotando atrás dela. Se ao menos a duquesa soubesse que não era exatamente um rapaz que desenhava.
— Percebo que está ótima, Vossa Graça — comentou enquanto a Lady soltava um resmungo ao se sentar. Com a mão direita apoiada na bengala.
— E você está equivocada, menina!
Bateu a bengala no chão como uma ordem para o cão que subiu em seu colo. Ela afagou a cabeça peluda do Charles Spaniel com naturalidade.
— Não estou nem um pouco ótima. Estou aborrecida.
Daisy fechou o caderno de desenho. Com o lápis marcando a página do tal “rapaz franzino”. Talvez se colocasse um pouco de enchimento nos ombros. Quem sabe se...
— Dalila! — A velha dama levantou a voz a fazendo sobressaltar. — Veio aqui para me ignorar? É influência do professor?
— Perdão, Milady. Apenas pensava no conselho que me deu sobre refazer o desenho. — Mordeu o lábio contemplativa. Será que conseguiriam fazer algo realmente convincente?
— Sua cabeça não para nunca, menina. — Soltou um riso curto. Tão breve que podia bem passar despercebido por alguém menos observador. — Como o professor consegue acompanhar? Ele não parece muito inteligente.
— Ele se casou comigo. — Deu um sorriso maroto. — É o homem mais inteligente que conheço.
Outro resmungo, alto e claro dessa vez. Girando o punho da bengala de forma distraída com a ponta fixa no chão.
— Algo a esta perturbando e suponho que não seja meu marido.
O pobre homem a quem provocava chamando de professor era, na verdade, um dos mais maravilhosos que já conhecera. O Barão de St. Crowell a tratava como uma rainha e não se importava nenhum pouco em assumir tal posição. Apoiou a mão sobre o ventre com um sorriso largo, uma postura levemente preguiçosa. Parecia que um príncipe ou princesa estava prestes a vir.
— Já sabe como vai chamá-lo? — Lady Limett quis saber.
— Diana se for menina. Benedict se for menino — contou com um sorriso carinhoso.
Não havia nada que desejasse mais do que homenagear pessoas que tiveram um papel tão maravilhoso na vida dela.
— Mas que falta de imaginação — reclamou ainda imersa no movimento da bengala.
— Vossa Graça não achou isso quando Diana deu seu nome para minha sobrinha mais velha — e ainda por cima era completamente apegada na pequena.
A duquesa semicerrou os olhos verdes e a encarou em repreensão.
— Eu a eduquei mal. Sua língua não cabe na boca.
Nunca coube, na verdade. Sua mãe antes de partir se esforçara bastante para transformá-la em uma menina tímida e desprovida de personalidade, porém — Graças aos céus! — era uma missão impossível.
— Por que não me conta o que a aborrece, Vossa Graça?
Ela contaria de qualquer forma, já que embora fizesse um esforço para negar como Daisy, a duquesa também tinha sérias dificuldades de guardar os próprios pensamentos e angústias para si.
— É o Duque de Limett. Está me perturbando o juízo.
— Está tendo sonhos com vosso falecido marido?
O cenho da duquesa franziu. Daisy mordeu o lábio inferior tentando conter uma gargalhada novamente. Estava mais audaciosa que o normal naquela tarde em suas provocações. A verdade é que a missão que Dayenne lhe entregara a havia deixado agitada e afoita — mais do que já era.
— O antigo duque, que descanse em paz de fato conseguia me tirar do sério de forma constante — e afirmou aquilo da forma mais carinhosa possível.
Não pela primeira vez a baronesa teve certeza que embora Lady Limett não mencionasse muito seu casamento, ele haveria de ter sido arrebatador. Uma mulher que não havia vivido o amor pleno jamais teria um senso de humor tão presente naquela idade, mesmo que escondido por uma fachada de resmungos.
— Mas eu estou me referindo, e tenho quase certeza que está fingindo não compreender, ao meu filho. O que se amasiou com uma mulher desqualificada e partiu para o interior para viver como um eremita.
Jeito peculiar de descrever que o Duque de Limett reencontrara o amor de sua juventude e a filha que acreditava ter perdido e agora estava vivendo feliz e discretamente em sua menor propriedade. Mandando a opinião da sociedade para o inferno.
— Eu a culpo, Dalila. — Agitou a bengala em sua direção, fazendo George se mexer, mas logo voltou a roncar. — Se tivesse escolhido Alexander ao invés do professor, nada disso teria acontecido.
Lady St. Crowell lhe sorriu, certa de que a velha dama a culparia até o fim de seus dias por aquilo.
— Todas, todas vocês me deram um trabalho imenso para se casarem — resmungou alto. — Ao menos Dília me dará um descanso.
Daquela vez, Daisy não conseguiu conter a gargalhada.

***

Dayenne Horiden — ou Dília, como chamava Lady Limett — andava de um lado para o outro na sala de estar vazia, ansiosa por alguma distração. O barulho do relógio começava a irritá-la. Seu cão como sempre havia sido afanado dela. Diana e Benedict tinham saído para tomar chá na casa de Lucy e ela negara o convite para esperar por Daisy.
Que como sempre estava atrasada.
Para piorar, a peruca castanha coçava sua cabeça — ainda demoraria algum tempo para se acostumar — e embora o ambiente ainda se encontrasse preenchido pelo cheiro adocicado, não havia um só biscoito no prato de porcelana sobre a mesa de centro.
Não pela primeira vez olhou para a campainha dos criados tentada a pedir mais uma leva e desistira em seguida. Era de sua natureza ser mais quieta e não querer incomodar. Além disso, bastava de biscoitos por aquele dia.
Com um suspiro resignado, ameaçou se sentar na intenção de se aquietar, então a ouviu. Em uma entrada triunfal como de costume. Reclamando algo sobre a quantidade de carruagens na rua com Clarence.
— Daisy! — exclamou indo em direção da baronesa de rosto oval, olhos e cabelos escuros tal como ela. — Você demorou uma vida.
— Lady Limett me convidou para um chá e da última vez que declinei a um convite dela ficou aborrecida por semanas e sabe como Sua Graça fica quando está aborrecida.
A última Srta. Horiden solteira reprimiu o comentário de que a irmã era muito semelhante quando contrariada.
— Mas eu consegui terminar o desenho que me pediu — afirmou abrindo o caderno na página correspondente. — A duquesa achou que se tratava de um rapaz franzino — comentou em tom risonho.
— A duqu... — Lady Limett havia visto aquilo? Ah! Por Deus! Se ela só desconfiasse, estavam encrencadas. — Daisy, isso está se tornando perigoso. Você tem um marido e uma criança a caminho. É melhor parar de me ajudar. Se alguém só desconfiasse...
Daisy deu um passo à frente e apoiou suas mãos nos ombros da caçula, a interrompendo. Uma determinação ferrenha no olhar.
— Você já foi longe demais para desistir agora — afirmou com os olhos fixos nos dela. — Eu não ligo para o que a maldita sociedade e acha disso. Você quer estudar medicina em Oxford e é o que fará.
Dayenne uniu a testa a da irmã e soltou um suspiro fundo em conforto. As chances estavam contra ela, porém não se escolhiam os sonhos. Eles apenas existiam e gritavam dentro de si até serem atendidos.
Dayenne crescera com sonhos gritando dentro dela e cada dia mais entendia que não seria justo continuar a ignorá-los.
— Mostre-me o desenho — cedeu com os olhos fechados ainda junto de Daisy. — Vamos fazer acontecer.

Preparem-se para ver dayenne aprontando pelos corredores de oxford. ainda em 2024, se tudo der certo!

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